segunda-feira, 15 de abril de 2013

Leite, lágrimas e sangue


Toda liquida, entrei no puerpério, essa fase mágica de auto-descobertas.
Estava muito feliz, tinha conseguido parir meu filho como o planejado, no conforto e respeito da minha casa, com a equipe humanizada: parteira e doula, duas queridas. A Neonatologista não chegou a tempo. Pari em tempo recorde, três horas e vinte aproximadamente da primeira contração de barriga inteira até a chegada do bebê. Meu primeiro filho, meu eterno e infinito amor. Era tanto amor, tanto amor (ainda é muito amor, mas naquela época parecia que não ia caber dentro de mim) que eu desaguava em lagrimas.
“Tens o mar perto dos olhos, oh menina”, minha avó portuguesa me dizia sempre que chorava quando pequena. Quantas sensações da minha infância nesse puerpério! Eu já esperava por elas, eu tinha lido muito sobre o assunto, mas ler e saber com o lado esquerdo do cérebro é muito diferente de viver. Olhava pro meu filho lindo que dormia e mamava, dormia e mamava e lembrava da minha irmã, minha irmãzinha que chegou em casa no começo do ano de 1983. Eu assistia Formiga Atômica na TV e não queria ver aquele bebê que parecia “filha de japonês” (conclui isso quando a vi pelo vidro do berçário na maternidade). Mas minha mãe me chamava: “Carolina, vem ver a irmazinha!” Nossa, que saudades da minha mãe!!! Corri pra abraça-la, e ela carregava minha irmã empacotada nos braços e não tinha braços pra mim, abracei a perna dela e logo ela abaixou pra me mostrar aquele pacote. Me derreti. Eu relutei, não queria gostar daquele bebê, mas ela era tão indefesa e cheirosa que eu não podia não gostar dela. Assim começou nossa relação de irmãs. Ela era a minha boneca preferida, e eu, sem querer passei a ama-la tanto!
Lembrava da minha mãe chorando pra amamenta-la e olhava meus peitos em carne viva e chorava também. Meu filho regurgitou rosa durante dez dias. Dez dias. A pega estava correta, eu me posicionava bem, ele pegava bem, mas eu sangrava, por cima  e por baixo, e eu chorava. Chorei muito, não só de dor no peito, mas pelas minhas dores de menina abandonada por um novo bebê. Mas eu não era mais a menina abandonada eu era a mãe desse novo bebê, de verdade. Minha mãe sempre me colocou uma responsabilidade sobre minha irmã que não era minha, não podia ser, mas eu a carreguei pela vida. Eu fui mãe da minha irmã também, mas sem poder ser mãe. Era uma carga muito pesada pra mim, e pra ela também que não podia me obedecer como mãe, já que eu era só a imã. Mas agora verdadeiramente eu era mãe. Eu era mãe, eu sou mãe. Meu sonho desde menina.
Mas se ser mãe era o que eu sempre quis, porque tantas lágrimas? Porque não se sinto nem um pouco sólida?? Porque tantas dúvidas?? Ai, porque tantos porquês??
Os porquês são parte da vida, e parte da maternagem consciente. Ainda bem que me vieram tantos porquês, hoje eu agradeço e os aceito como parte da vida de mãe. Os soluciono em partes, claro, tem porquês que nunca se solucionarão e hoje aceito que isso faz parte da vida também.
Mas e aí, porque eu sou toda liquida??
Hoje concluo que pra receber esse bebê eu precisei ficar toda liquida, toda maleável, extremamente maleável como ele, pra aceitá-lo como ele era, e entende-lo, e acolhe-lo.
A natureza é muito sábia, e eu agradeço ter podido me conectar a ele apesar de estar no meio de uma cidade fria de pedra, uma cidade rápida e masculina onde as mães e bebês não tem vez, no máximo tem lugar no metrô, às vezes nem isso!
Eu pude me desconectar de tudo em volta e viver minha maternagem liquida. E foi lindo, mágico e revelador.
Eu agradeço ao feminino que me habita e que pude encontrar e reconhecer!
Agradeço à todo leite, toda lágrima e todo sangue que jorrei, com eles pude lavar a alma!
Um imenso obrigada à vida!!!


terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

maternagem consciente e auto-cura

Depois que me tornei mãe não dá mais pra fingir que já passou. Já passou cronologicamente, mas as feridas abertas estão aqui no meu peito. E estão tão abertas que voltei a ter a mesma alergia que tive em 1993, a mesma coceira cheia de brotoejas que se alastram pelo corpo a partir do meu peito. Parece que tenho 13 anos de novo e esse buraco enorme de menina violentada está aberto e infeccionado, cheio de pus e agora precisa ser cuidado de verdade.
Obrigada filho, por ter me feito olhar pra mim mesma e me dar a chance de não poder fugir mais uma vez de encarar minhas feridas.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Dia P

Antes de mais nada queria agradecer às mulheres incríveis das comunidades "Parto Nosso" e "Materna SP", muitas das quais eu nunca tive o prazer de conhecer pessoalmente, mas que estavam lá dando apoio e carinho e me ajudando tanto nesse processo. À Bia Takata que fotografou o parto – na verdade eu fui tão rápida que ela chegou já depois no Nuno nascer, mas fotografou esse momento único e tão incrível que foi nosso re-conhecimento com o Nuno. Ao meu pai que durante o trabalho de parto foi calmamente em casa pegar nossa cadela e as duas gatas que miavam/latiam como filhotes atrás da onça-mãe gritando com contrações pela sala pra lá e pra cá. 
Agradeço muito à minha tia Tereza que cozinhou durante toda a gravidez pra que eu não morresse de inanição e enjoo e me ouviu e foi molhada de lágrimas diversas vezes. 
Eternos agradecimentos à minha querida doula e grande amiga Mariana de Mesquita, à minha parteira super-heroína Ana Cristina Duarte, à minha terapeuta-"vidente" Cleide Lopes, por todo apoio, paciência, carinho e dedicação, sem vocês eu não teria conseguido.

E agora sim, o relato "parido":


Logo que engravidei enjoei tanto que fiquei de cama, como se estivesse doente, até a 18° semana de gestação. Eu sabia que eu tinha um longo e árduo caminho a percorrer pra estar pronta dali nove meses. Eu tinha que passar de menina-filha que foi abandonada pela mãe, a mulher-mãe que nunca vai abandonar um filho. 

Mesmo antes de engravidar eu já havia pesquisado sobre parto, eu já estava nas listas de discussão, e já havia lido alguns livros, matérias e outros materiais sobre parto humanizado e eu queria, com a cabeça, um parto domiciliar. 
Eu me preparei, logo na oitava semana escolhi minha doula que foi essencial nesse processo, Mariana. Nos encontrávamos uma vez por mês e ela foi me passando exercícios para fazer todos os dias, me ensinou a andar de cócoras, a respirar pela vagina, a fazer alongamentos de músculos que eu nem sabia que existiam em mim. Me indicou a morfoanálise, eu fui. Estava exausta da psicanálise cabeção, daquela poltrona onde me sentei durante anos e onde de fato fiz muitas descobertas, mas que agora não me servia mais. Depois desse tempo todo só o que restou foi apenas a frustração de ter consciência sobre todos os meus problemas mas não conseguir resolve-los. Na morfoanálise, Cleide me ajudou a entrar em mim, lá dentro, bem fundo, através do trabalho corporal, durante o qual tive diversos insites, muitas lembranças da infância e da minha mãe, e finalmente alguma compreensão e alivio sobre muitas coisas a que fui obrigada a passar nessa época da vida. E as coisas começaram a mudar, eu mudei, eu me permiti. Fiquei flexível, com meu corpo abarrotado de estrogênio e relaxina pude me dobrar e desdobrar, eu estava pronta pra parir. Eu queria parir em casa, agora com uma vontade e força que vinham do fundo do meu útero, já bem esticado. 
Durante a gravidez também, eu e meu marido fizemos terapia de casal pra aparar umas arestas e traze-lo pra dentro dessa jornada que até então parecia que estava trilhando sozinha. Ele veio com rapidez, como uma prova de amor e devoção. Ele não estava sob os efeitos da relaxina mas conseguiu se esticar pra me alcançar e me dar todo o apoio que eu precisei, e assim foi, assim fomos...
Eram 11 e tantoda noite do dia 4 de maio de 2012 quando eu senti minha barriga ficar inteira dura, numa contração bem diferente das contrações de treinamento, era maior, era mais forte, era uma contração com C maiúsculo. Era a minha 39° semana de gestação, liguei para minha querida doula Mariana pra dizer que estava em pródromos, ela acreditou, as contrações estavam sem ritmo e minha voz não mudava ao telefone quando elas vinham. E não havia dor nenhuma ali mesmo. Ela foi dormir, e eu aceitei o convite do meu marido de assistirmos alguns episódios inéditos de algumas séries que ele tinha baixado. E a cada contração que vinha eu ia fazendo os exercícios da Therésse Bertherat, do "Quando o Corpo Consente".
Na verdade mais especificamente o exercício de maxilar e o sugerido para o trabalho de parto, que é tentar encostar o umbigo na vagina num movimento de flexão com respiração, e "respirar pela vagina".  
Assistimos um "Once Upon a Time", e eu fui umas duas ou três vezes fazer xixi no meio do episódio, depois colocamos dois episódios de "Two and a Half Men" e eu comecei a alternar os xixis com cocô. Me perguntei se isso não era já um trabalho de parto mas as contrações não eram doloridas, eram apenas incomodas. E então no meio do episódio final da última temporada de "The Big Bang Theory", vomitei todo o jantar e "decidi" que aquilo era sim um trabalho de parto, se não era então meu parto domiciliar estava arruinado, eu ia querer analgesia! Ligamos de novo pra Mariana e ela pediu que eu me tocasse pra ver a dilatação mas minha barriga estava tão grande que eu não conseguia, então Rafa colocou a luva e fez o toque. Ao invés de um "túnel com bordas lá no fundo" ele sentiu logo uma coisa lisa e dura bem na
entrada do canal vaginal Ele não sabe ao certo mas concluiu que aquilo eram uns 7 ou 8 cm de dilatação já que abriu bem os dedos e a bolsa já estava no meio do caminho. Eu fui pro chuveiro (ah, a água quente...) e um tempo depois a resistência queimou. Eu bati nele, dei vários socos no braço porque fazia duas semanas que estávamos brigando por "chamar ou não chamar o eletricista". Pro chuveiro funcionar mais do que 15 minutos no "bem quente" teríamos que trocar toda a fiação e o disjuntor, mas Rafa disse que o eletricista estava me enganando querendo ganhar em cima e que não era necessário isso tudo, que o chuveiro aguentava. Eu briguei feio no dia anterior e chamei o eletricista que podia vir fazer o serviço no sábado logo cedo... É, só que era madrugada da sexta pro sábado e eu ia parir sem água quente! É difícil ter razão durante o trabalho de parto.
Saí do chuveiro e já estava naquele transe, a tal da partolândia. Uma viagem louca, cheia de sensações, lembranças e impressões. Eu andava pela casa, não podia ficar parada, não tinha mais posição. Eu amaldiçoei a pessoa que disse que tem que achar uma posição confortável para a contração, porque quando as contrações vinham não havia jeito, era uma onda enorme que ia me engolir, ia me engolir, eu sabia que ia! Cada uma delas dava a impressão que ia me levar pra longe e nunca mais me devolver. Então eu me lembrei que tinha que me entregar, que tinha que deixar a onda me levar pra onde quisesse, era só me lembrar de "respirar" vez ou outra quando pudesse. Então eu fui. Lá pra dentro, tão lá dentro que nada parecia real. Algumas contrações eram prazerosas enquanto que outras pareciam ser um mergulho no inferno de Dante. Eu tive a oportunidade de falar com minha mãe: "Então é assim? Foi por isso que você me deixou? Eu te fiz sofrer?? Eu não tive culpa, eu não queria... Será que vou fazer como você e abandonar meu filho? Eu não quero, eu não posso repetir o erro. Nuno, eu vou ser melhor que ela foi comigo, filho, eu te prometo, eu vou ser melhor, eu não vou te deixar, eu não vou embora..." Então Rafa encostou em mim, segurou meu braço enquanto eu chorava e eu fiquei meio violenta, hoje percebo que me veio a mesma sensação física de quando eu fui abusada na infancia e pre-adolescencia, eu gritei: "TIRA A MÃO DE MIM! ME DEIXA! NÃO ME ENCOSTA!!!". E então me dei conta que tava gritando e empurrando meu amor, meu grande amor, que estava ali me apoiando e aí eu o segurei pelo braço, peguei a mão dele e a coloquei em mim, então assim ele podia me tocar. E assim ficamos, ele andava segurando meus antebraços e eu segurava nos dele e fomos andando pelo apartamento apertado. Eu queria mais espaço pra andar, amaldiçoei a verticalização das cidades, a vida moderna, a minha vida. E eu disse a ele: "eu não sei amar, eu não sei amar, como eu vou criar essa criança? Eu faço tudo errado eu sufoco quem eu amo, eu sou toda errada, como vou conseguir ensinar esse menino a viver? Eu não sei viver!" Rafa me lembrou que isso era só um medo sem sentido, que eu podia, que eu aprendi a viver, que eu escolhi a vida, escolhi curar minhas feridas e seguir em frente, e que eu já estava fazendo o melhor pra ele, que eu ia conseguir, que eu só precisava seguir meu coração, meus instintos. Então eu me dei conta que não sei desde quando eu quero ser mãe. Desde muito pequena, tão pequena que nem me lembro. Eu me preparei a vida toda pra isso e finalmente meu grande sonho estava se realizando, meu filho tão esperado ia chegar a qualquer momento! E eu chorei e falei pra ele não se assustar que eu precisava exorcizar uns demônios pra ele poder nascer.
Acho que nesse momento, ou em algum outro que não me lembro (a lembrança do parto é como de um sonho, como que envolta numa névoa) chegou Mariana e Ana Cris com uma bagagem enorme, umas quatro malas que Rafa foi ajudar a carregar. Parecia que as portas dos céus tinham se aberto e a chegada delas juntas me deu a certeza de que ele ia nascer logo, me deu segurança, a segurança que eu
precisava pra parir. A Mari durante a gestação se tornou uma grande amiga. E Ana Cris foi uma mãe, firme e carinhosa como só ela sabe ser. Essas duas mulheres me ensinaram muita coisa e sem elas eu não teria nem chegado na metade do caminho. A primeira coisa que disse pra Mari foi: "NÃO TEM POSIÇÃO, É MENTIRA, NÃO TEM POSIÇÃO, VC DISSE QUE TINHA, MAS NÃO TEM!!" – e comecei a chorar. Ela me acalmou, me levou pra cima do edredom estendido na frente do sofá e fez massagem nas minhas costas, o que foi um grande alívio. Enquanto isso, Ana Cris foi lavar as mãos e durante uma das contrações a bolsa estourou e eu vi mecônio. Eu apontei pro líquido e disse: "MECÔNIO, MECÔNIO!!!" Mari disse pra eu não me preocupar e Ana Cris veio e ouviu os batimentos, tudo ok, o mecônio estava lá mas os batimentos do coraçãozinho dele estavam ótimos. Ela colocou as luvas pra fazer o toque, estava nascendo, a cabeça dele estava logo ali. Na hora ela disse: Mariana, pega a banqueta e os lençóis descartáveis, tá nascendo! Sentei na banqueta e disse algo assim: "Eu achei que eram os pródromos, Ana Cris, achei que ia ter tempo de fazer a unha e pintar de vermelho pra fazer inveja nas cesareadas de eletiva que tem que tirar o esmalte pra entrar no centro cirúrgico! Não consegui fazer nada, Ana Cris, nem minha play list eu ouvi!!" Ela riu, veio uma contração, eu segurei e disse que queria a piscina. AC respondeu: "querida, não vai dar tempo nem de inflar, você é rapidinha, já tá nascendo, faz uma força que o Nuno nasce!" Veio mais uma contração e eu achei que ia rachar ao meio! E pedi então uma bacia com água quente pra eu sentar por que se não eu ia lacerar, eu sabia que ia lacerar!
AC deu uma olhadela no meu períneo e disse: "Não vai não, tem períneo pra dar e vender aí querida, faz uma força que ele nasce!" Eu insistia que ia lacerar, e durante essas contrações finais, tentando segurar o processo, falei tantos palavrões que descobri mais uma habilidade minha: posso escrever um dicionário de palavras de baixo calão em português.
Assim ficamos uns minutos, AC e Mariana dizendo que eu não ia lacerar, que não precisava ter medo disso e eu rebatia com um: "eu só cheguei no 26 do epi-no, eu vou lacerar!"
E então durante uma contração percebi que eu fazia movimentos com a cabeça, era um balanço como se fossem "nãos" frenéticos, pra direita e pra esquerda, bem rápido. Eu estava negando tudo, eu estava paralisada de medo, eu estava me tornando mãe. Era uma passagem sem volta, uma revolução na minha vida. Meu bebê estava ali, era real, ele se mexia no meu canal vaginal lutando pra nascer.
Percebi que precisava ajuda-lo nessa passagem, era o nascimento dele, meu filho, essa pessoinha que foi crescendo dentro de mim e que eu já amava tanto. Era a minha primeira missão como mãe, eu tinha que trazê-lo ao mundo, deixar meus medos de lado e ajuda-lo a vir.
Então, me veio essa vontade louca de ter meu filho nos braços e a certeza de que eu ia conseguir dar conta de ser mãe. Veio uma força enorme de dentro de mim, e eu fiz uma força de verdade e veio a cabeça dele, e mais uma força e meu corpo foi tomado pela melhor sensação da minha vida, meu filho veio pros meus braços.
Às 3:18 daquela madrugada do dia 5 de maio, dia incrível. Ele chorou um pouquinho, só pra dizer que chegou. AC me aplicou ocitocina intramuscular preventivamente, eu tinha risco de hemorragia pelo parto ser muito rápido. A placenta dequitou e Rafa cortou o cordão umbilical, Nuno mamou muito. 
Tudo correu perfeitamente bem, a tão temida laceração no períneo não existiu, e eu pude tomar um banho logo que levantei do sofá e fui pro quarto.
Não sei dizer em palavras o que senti, só sei dizer que minha vida valeu a pena, cada dia que passo com meu filho, cada hora com ele, vale a minha vida.

São Paulo, 17 de Agosto de 2012

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Nuno, meu filho,

Está chegando a hora, sua vida uterina está chegando ao fim.
Fiz de tudo pra que você se sentisse bem aí, mas a coisa está ficando apertada, você está crescendo bastante, e apesar de não parecer pra você agora, isso é um ótimo sinal.
Em breve seremos eu e você trabalhando juntos pra que você conheça esse mundo aqui do lado de fora. Farei de tudo pra que essa passagem seja o mais sutil e menos agressiva possível pra você.
Estou muito ansiosa pra te conhecer mas não quero que você se apresse por isso, quero que você fique tranquilo e aproveite cada momento, agora e sempre.
A vida é isso, feita de momentos, basta que nós saibamos aproveitá-los.

Com todo amor que há nesta vida,
Sua mãe.

Monstros internos

Tantos pensamentos, tantas dúvidas...
Me sinto tão perdida, apesar de parecer muito certa e muito convicta de todas as escolhas que fiz.
A verdade é que não sei nada!
Eu não tenho medo do evento fisiológico do parto, assim como a maioria das mulheres que temem as dores, as contrações, o sofrimento fetal, temem uma vagina lacerada, uma bexiga caída... Os eventos fisiológicos do parto me parecem naturais, o que temo de fato é o evento psicológico do meu parto, que pode atrapalhar todo o processo fisiológico natural. Fico pensando nas coisas todas que hei de elaborar durante um trabalho de parto... Esses rancores, essas tristesas, essa mãe fugitiva que tive, os abusos que sofri. Será que tudo isso me virá durante o trabalho de parto?? O que mais eu tenho pra elaborar? Será que tenho que perdoar minha mãe pra parir?? Se não consegui fazer isso em 20 anos, como farei em algumas horas??
Sempre preferi as dores físicas às emocionais. Não é a toa que tenho uma tatuagem que cobre 1/4 do meu corpo. Nunca reclamei a toa de dor, não gosto de parecer fraca, de me sentir fraca, mas a gestação já me ensinou isso, de que agora tudo mudou, eu serei o que tenho que ser, sentirei o que tenho que sentir e não há nada que eu possa fazer sobre isso a não ser abraçar tudo e deixar a contecer.
Acho que a resposta é essa: abraçar, o que quer que seja. Abraçar meus monstros seja lá de onde eles vierem ou quão feios pareçam. Vou abraçar toda e qualquer coisa feia, bonita, tosca, medonha, e assim, ao final de tudo quem estará nos meus braços é meu filho.
Que venham, que venham todos os monstros do mundo!




segunda-feira, 2 de abril de 2012

novos caminhos

Sei que estas semanas finais de gestação são meus últimos momentos comigo mesma, a partir do parto serei outra, serei mãe, serei dois: eu e Nuno. Nunca mais só eu, mesmo depois dele grande, adolescente ou adulto, sempre terei  ele comigo, ou a separação dele comigo. 
“Filhos são pra sempre” dizem por aí, e agora com ele crescendo tanto  e espremendo meus órgãos dentro da minha barriga começo a ter uma leve mostra disso. 
Em breve serei uma outra pessoa. A gestação já me mudou um tanto e o puerpério vai reformular tudo a partir do que eu nem imagino que seja.  Eu sei que depois que ele vier, tudo será absolutamente diferente.
Dizem que as mulheres não cabem mais nas próprias roupas, não porque não tenham emagrecido no pós parto, mas sim por não caberem psicologicamente em suas roupas de antes da maternidade.  Não cabem mais nos seus antigos empregos, nos seus antigos valores de vida...
Tenho medo, um medo enorme de não caber mais em mim, de me perder numa estrada sem volta onde terei que enterrar essa parte de mim, talvez uma parte que eu goste muito, e começar tudo de novo, num ciclo novo, numa nova Carolina que até engravidar estava tão encaminhada e certa de seu destino...

sábado, 17 de março de 2012

Sonhos

Tive diversos pesadelos e sonhos estranhos nos primeiros meses de gestação, depois meu sono se acalmou, parei de acordar tantas vezes a noite ressaltada com as bizarrices do meu inconsciente, que as vezes me prega peças com sonhos assustadoramente criativos e enigmáticos.
Agora eles voltaram com força total.
Li num desses sites sobre bebês e gravidez que é muito comum "sonhar com monstros, fantasmas do passado e animais" por conta da carga de progesterona que fica cada vez maior no corpo da gestante, além da ansiedade toda em se tornar de fato mãe.
Bem, a ansiedade existe mas não está me afetando de forma negativa. De alguma maneira pela primeira vez na vida, a ansiedade me deu forças pra fazer o que preciso pra receber meu filho. É uma força mágica que nunca tive na vida, um impulso forte que me faz acordar de manhã e organizar a casa, o enxolval, fazer exercícios para o parto, ler mais sobre tudo isso... Normalmente a ansiedade me paraliza, de agonia, retarda qualquer trabalho que eu tenha que fazer, e só controlando a ansiedade é que consigo executar algo necessário. A vida toda foi um combate entre meus sentimentos e o que eu queria fazer.
Agora as coisas fluem, como deve ser, e tudo vai pro seu lugar.

domingo, 4 de março de 2012

O parto domiciliar e o resto do mundo

Quando falo sobre parto domiciliar, ou mesmo sobre parto natural hospitalar, percebo que sem querer acabo por ofender a maior parte das pessoas.
Falar que uma cesárea por volta de cordão foi desnecessária, que toda mulher com gestação de baixo risco pode e deve parir sem intervenções, dizer que estourarem a bolsa artificialmente em pleno trabalho de parto fez o bebê correr risco e que esse parto acabou em cesárea por imperícia da equipe e manipulação desnecessária do parto, pode soar que estou querendo dizer que meu interlocutor é um loser, ou que a mãe dele é, ou a mulher, a irmã, a sobrinha, a tia, a vizinha, o mundo todo é loser – visto as altas taxas de cesáreas no Brasil, maiores ainda no setor privado. Existe essa mácula e a pessoa se nega a aceitar os fatos, se nega a compreender as evidencias científicas, por mais inteligente e capaz intelectualmente que ela seja. Não lê os artigos e livros indicados por mim e rebate com informações dos livros de obstetrícia defasados como se eles fossem a fonte do saber eterno.
Falar sobre parto é tocar em feridas profundas, e as coisas ainda pioram quando se trata de mulheres cesareadas por vontade própria ou por uma cega confiança no médico que a acompanhou. Como é que esse médico, tão bacana, tão bem indicado, ou mesmo um membro da família pode estar errado? Como é que essas pessoas podem abandonar tudo o que elas acreditam, rever seus sentimentos, enxergar que passaram por procedimentos desnecessários, seja em seus nascimentos ou nos nascimentos de seus filhos e aceitar de uma hora pra outra que até agora elas foram levadas pelo sistema? Que foram páreas do abuso de poder de seus médicos de confiança?
E os médicos? Como aceitar que as escolas de medicina adotam livros de obstetrícia pra lá de ultrapassados, e praticamente ter que jogar no lixo a maior parte de sua formação como GO? Como, de repente, esperar que uma pessoa abandone tudo que ela acreditou até agora, que abandone o castelinho onde se escondeu pela vida toda e agora querer que ela saia por aí andando sendo que ela não sabe nem o que é andar?
A única coisa que as pessoas podem fazer é ter a certeza de que eu sou uma louca e escolhi parir em casa com uma parteira porque não sei o que estou fazendo. Estou trilhando um caminho extremamente perigoso, ouvindo pessoas que não são médicos "de confiança", que não sabem do que estão falando, que seguem uma modinha – apesar de existirem apenas alguns parcos partos domiciliares no Brasil, depois que a Gisele Bundchen pariu em casa, o parto domiciliar tem fama de estar na moda.
Sou eu que estou sendo guiada por perigosas e enganosas ideias libertárias, e ignoro os avanços da medicina correndo o grande risco de ter um natimorto e até mesmo perder minha vida no parto –“você não viu aquela australiana??” - me perguntam, se referindo a Caroline Lovell que faleceu na UTI do hospital no dia seguinte ao parto de parada cardíaca em decorrencia de problemas cardíacos no pós parto. E se eu rebater com um “as pessoas também morrem do coração nas aulas de aeróbica na academia” o argumento não tem poder, porque sou eu que não quero ver a verdade, sou eu que não quero aceitar que estou errada, sou eu que não quero dar o braço a torcer.
Eu quero ser moderninha, descolada, neo hippie, antenada. Quero fazer diferente pra aparecer à custa da vida do meu filho. Não é porque eu quero recebê-lo em meus braços e ter a chance de nos olhar por um longo tempo, ter tempo pra conhecer suas feições e ele às minhas, sentir seu cheiro, deixá-lo sentir-se seguro no meu colo reconhecendo meus batimentos cardíacos. Não é porque quero que ele não sofra intervenções desnecessárias do protocolo hospitalar, como ser levado pra ficar por horas "em observação" num berçário, longe de mim, numa separação violenta, que o fará chorar em coro com mais 15 ou 20 bebês, cada um deles num berço estranho e vazio, longe de tudo que conhecem até então. Não é porque quero que ele por si só encontre meu peito e mame quando sentir que deve, sem efeitos de anestesia, sem luzes atordoantes de hospital, sem enfermeiras pra lá e pra cá intervindo nesse nosso momento mágico... Eu devo ser mesmo egoísta por querer dar o melhor por meu filho no nascimento dele.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

23° semana

Você cresceu muito, minha barriga doeu, os músculos se esticaram muito rápido, fiquei um pouco sem equilíbrio, minha coluna parecia que ia se partir em duas partes. Os enjôos melhoraram, mas na seqüência comecei a ter refluxo e passei a ter que dormir reclinada. Com tantas mudanças no meu corpo e a evidencia cada vez maior da sua chegada me senti frágil e parei de ler notícias, mas mesmo assim não pude deixar de saber o que andou acontecendo lá fora: começaram a barrar o Xingu; o Kassab cometeu mais crimes contra os direitos humanos e roubou mais, entre outros delitos; mais pessoas foram despejadas das favelas do Rio, com a desculpa de risco de deslizamentos, as construtoras querem de qualquer jeito aqueles morros para fazer condomínios de luxo com vista para o mar até a Copa de 2014. E se antes eu já era uma andorinha tentando fazer verão contra esse mundo do avesso, agora com você dentro de mim, nem meia andorinha posso ser. Mas de repente você chutou, só eu pude sentir, eram chutes tímidos. As semanas foram passando, pude sentir você crescer tomando mais espaço dentro de mim e dando chutes mais fortes, que agora podem ser percebidos por qualquer um que ponha a mão sobre minha barriga. E então veio essa compreensão de que não estou fraca e inútil, estou mais forte do que nunca. Estou gerando você, sinto sua força dentro de mim, uma força tão grande que preciso descansar para que você consiga se desenvolver. Entendi que tudo mudou agora, eu sou sua mãe, e essa é a melhor coisa que eu poderia fazer por mim, pelo seu pai e pelo mundo. Fazer você, apesar de todo o desconforto com as mudanças no meu corpo, tem sido a melhor experiência da minha vida.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

"mulher barriguda que vai ter menino, qual o destino que ele vai teeer?"

Novo código florestal é aprovado no senado.
Quando há um deslizamento de terra no Rio ou em Santa Catarina, a Rede Globo dá total cobertura, mostrando a tragédia dessas pessoas que perderam tudo. De todos os lugares do Brasil, pessoas mandam mantimentos, água potável e dinheiro, cidadãos complacentes com a tragédia alheia, mas não entendem que isso tem a ver com a política “tapa sol com a peneira” porca de Brasília. Agora, o senado anistia madeireiros e posseiros, criminosos de alto e baixo escalão. Dão poder a fazendeiros para arrasarem com reservas florestais, entre outros delitos contra o meio ambiente, e contra a humanidade, já que no pé em que estamos não haverá conforto, e indo por esta vereda, nem mesmo vida humana na Terra nas próximas décadas.
Alunos da USP são detidos em invasão a reitoria, pedindo a expulsão da polícia militar do campus.
Enquanto o pau come e é noticiado pelo “brilhante” jornalismo brasileiro nos canais de TV, as pessoas no Facebook malham os cem alunos que foram lá reinvidicar seus direitos de ir e vir dentro da universidade. Já que não se trata apenas de PM apreendendo moleque maconheiro, como muitos querem que seja, mas sim, de uma conduta estúpida militarista e ditatorial do estado de São Paulo sobre os cidadãos em geral. E esta deveria ser a reação de todos os cidadãos: exigir segurança, exigir seu direito de ir e vir, exigir respeito. Mas pelo visto estamos caminhando no sentido oposto, vide o toque de recolher decretado pela PM ao CRUSP. Eu queria ver se alguém resolvesse que o pessoal ali de Alphaville 5 não pode sair de madrugada...

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A singela beleza do primeiro trimestre de gravidez

No inicio era enxaqueca e um leve enjôo, e um cansaço sem motivo antes mesmo do atraso menstrual. Depois com os hormônios galopantes que invadiram meu corpo, ganhei duas idas ao pronto atendimento pra soro e medicação e uma bexiga solta - a cada jato de vomito que vinha por cima mandava um jato por baixo e assim estrelei um freeakshow escatológico no ambulatório do hospital: uma poça de mijo e vômitos compulsivos que assustou até os enfermeiros de plantão. Junto a isso tudo, muitos gases e dores de barriga porque o intestino, também influenciado pelos hormônios, fica “preguiçoso” e quase para de funcionar.
Agora os enjôos ficaram mais leves, com vômitos menos “sofridos”, se tornou uma coisa natural vomitar, simplesmente pego o saquinho da bolsa, sento onde estiver e vomito, depois dou o devido fim ao saco plástico e mastigo um chiclete de menta, o único que consigo sentir o cheiro. Mas com o alívio dos enjôos e vômitos fortes vieram dores de cabeça moderadas que me assolam juntamente com uma cólica chata que vai até a lombar: ficar em pé dói, sentar dói, deitar dói, agachar então, nem se fala!
O último exame de ultrassom tirou todas as dúvidas quanto a um bebê saudável se formando em mim, mas identificou uma placenta prévia, que quer dizer que devo fazer repouso ou corro o risco de aborto. Bacana, tanto esforço, tantos vômitos, calças molhadas e humilhação pública, tanta água potável e alimentos desperdiçada na privava pra agora eu ter uma placenta “defeituosa” que não me deixa voltar a ter minhas atividades sob o pretexto de não segurar meu filho.
Pelo visto terei todos os “sintomas” da gravidez, TODOS.
Fico pensando que se sou tão suscetível aos hormônios, ao menos existe a esperança de um parto rápido quando a ocitocina tomar meu corpo e começar a dilatar meu útero durante o trabalho de parto.
Que Darwin seja bondoso!

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

de volta aos 15

Sinto como se tivesse voltado à adolescência, é como se meu auto controle, minha razão, meu bom senso e tudo o que consegui arduamente nesse processo de “adultização” tivesse ido por água abaixo.
Eu sinto uma fome avassaladora e depois um sono que mal me mantenho em pé, durmo muito e acordo em intervalos para beber água e fazer xixi. Também acordo assustada com alguns sonhos que normalmente remontam fatos ocorridos no passado, daquele jeito que são meus sonhos, sempre vestidos pro carnaval. Por vezes acho que tenho uma bicha carnavalesca afetada no lugar do inconsciente.
As espinhas e cravos voltaram com força total e o pior é que nem tratamento para pele posso fazer, já que até mesmo um inofensivo sabonete comprado na farmácia pode afetar o bom desenvolvimento do bebê. Nessas horas a única coisa possível a fazer é se contentar com uma cara de Choquito e não se olhar muito no espelho pra não assustar.
Sinto um saco cheio de tudo, do mundo a minha volta, do tempo que não passa, da barriga que não cresce... Sinto palpitações de pensar em voltar a trabalhar, eu quero muito, mas ao mesmo tempo parece que meu corpo não deixa.
É isso, como na adolescência, meu corpo não alcança a mente, ou vice e versa.

ressaca


Os enjôos pareciam que estavam prestes a desaparecer, já que o corpo lúteo (responsavel pelos enjoos da gravidez) vai embora dando lugar a uma linda e protetora placenta nesta época da gestação em que me encontro.  Mas hoje acordei como que virada do avesso. Não tive forças pra levantar da cama, muito menos pra dirigir até a casa da minha tia Tereza (tia salvadora de todas as horas de desespero) que desde que apertaram os enjôos pacientemente cozinha pra mim todos os dias, perguntando sempre minhas preferências e me alimentando com o que consigo comer. Um tempinho depois do almoço ela me serve um café com leite que só ela sabe fazer, já que não agüento nem o cheiro de outro café.
Acho que fui com muita sede ao pote, desconsiderei minha condição de gestante nesse final de semana, agora sinto a ressaca arrebatadora. 
Meu pai foi buscar o almoço que quase não consegui comer... 

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

alma de vira lata


Não sei se estou colocando o carro na frente dos bois, mas desde que engravidei, e até mesmo antes, uma das minhas maiores preocupações é a maneira em que meu filho virá ao mundo.  Ou seja, a hora do parto. Bem, mesmo que seja uma preocupação antecipada, eu sou do tipo que anda com os bois pra trás mesmo, então, já comprei cinco livros sobre parto e um sobre maternidade, li tudo que havia na internet sobre parto humanizado e até mesmo entrei num grupo de discussão sobre o assunto. Mesmo assim, ainda tenho infinitas questões a resolver até chegar ao que eu chamaria de “clareza sobre o parto”.
Mas uma das coisas que aprendi nos livros é que é de grande ajuda a mãe cantar entre as contrações, então estou pensando em algumas musicas que eu poderia cantar para o bebê nascer.  Daí me lembrei d’Os Saltimbancos, meu disco preferido na infância. Sem dúvida,  minha música preferida é a da gata e então eu me toquei o quanto em pequena eu era a gata do “apartamento, almofada e trato” e o quanto eu já almejava sair pela rua ” cantando e virando lata, sendo eu, mais eu, mais gata...”
Não é engraçado que minha música preferida na infância seja hoje uma música que me identifico pela minha trajetória de vida? De sair da bolha que a família tentou me manter por toda a vida e hoje ser de fato eu, do jeito que nasci pra ser?
Aí vai o link pro vídeo:
http://youtu.be/K9KQzxAuKlg